No artigo anterior iniciamos a refletir sobre a história de vida de Anita* e o seu processo de cura da criança interior ferida. Neste artigo, refletiremos sobre como os pais produzem feridas psíquicas na criança, que irá culminar com processos de ferimentos psíquicos que podem durar a vida inteira se não forem ressignificados.
Quando um pai, ou a mãe, chama um(a) filho(a) de estúpido, de débil mental, de burro e outros adjetivos negativos – Você é estúpido, é um débil mental, é burro…, – como fez o pai de Anita* –, o que acontece na mente do filho, especialmente na primeira infância, período que vai do nascimento até os sete anos de idade? Nessa fase a criança não tem capacidade de abstrair, de separar o que realmente são dificuldades dela, das dificuldades dos pais. Quando eles a estimulam negativamente – e o pai e a mãe fazem isso, comumente, com muita energia mental extremamente tóxica, gritando, acusando, de dedo em riste –, irão gerar graves comprometimentos de sua formação psicoemocional.
Toda a criança, principalmente até os 7 anos, é totalmente dependente do pai e da mãe ou, na falta destes, de outros adultos que os substituam. A criança é totalmente dependente e essa dependência gera impotência em relação ao meio, uma impotência natural. Um recém-nascido, por exemplo, se não tiver um adulto para cuidar dele, perece depois de algum tempo.
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Isso acontece até mais ou menos os 7 anos. Se uma criança na primeira infância for abandonada e não tiver um adulto para cuidar dela, perece, pois não sabe ainda se manter. A partir dos 7 anos ela começa a ter uma independência um pouco maior. De um modo geral, já consegue fazer várias coisas sozinha.
Como o aprendizado será fixado por meio de padrões verbais e imagens, a criança aprende que é burra, que é débil mental, que nunca vai ser nada na vida, que não tem nenhum valor, repetindo isso mentalmente para si mesma, por meio do diálogo interno, ou para as outras pessoas, ao mesmo tempo em que se imagina burra, incapaz etc. É isso que os pais estão fazendo com seus filhos, mesmo se têm boas intenções – que estão mal direcionadas –, estimulando a baixa autoestima, a incapacidade etc.
Com o tempo, esses estímulos são transformados em crenças, não necessitando mais do estímulo negativo dos pais. Com o tempo o estímulo virá, após a fixação do aprendizado em forma de crença, da própria criança. Quando o filho, ou filha, for para a escola e tiver alguma dificuldade, dirá assim: Eu sou burro. Eu sou um débil mental. Eu não consigo aprender. Tenho que estudar mais do que os outros para aprender, porque sou burro. Os pais já não precisam falar isso para a criança, pois ela mesmo se deprecia dessa forma. É claro que os estímulos negativos dos pais muitas vezes continuam, mas apenas reforçam aquilo que já está implantado. Ao agirem assim, geram ferimentos psíquicos em seus filhos, repetindo um padrão que eles próprios, muitas vezes, tiveram dos seus pais e que também os tornaram crianças feridas.
A repetição
A repetição sistemática de estímulos negativos com que o pai, a mãe, professores e outros adultos significativos, que se comunicam com a criança, funciona como uma ordem hipnótica para ela. Imaginemos uma criança, principalmente na primeira infância, ouvindo durante anos a fio, dia após dia, frases como estas: Você é burro/a; você é desajeitado/a; como é lerdo/a esse/a menino/a; nunca vai conseguir ser alguém na vida, carregadas de energia mental tóxica, agressiva.
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Após certo tempo, os esquemas cognitivos se tornam uma crença. A criança passa a crer que não tem nenhum valor, que é incapaz etc., tornando-se profundamente ferida. Cada movimento de prepotência do pai, ou da mãe, e outros adultos significativos – como os professores –, vai gerando feridas na criança.
Isso começa na própria infância. Só que, psiquicamente, a criança não desaparece. A estrutura psíquica da criança permanece, mesmo quando a pessoa cresce e se torna adulta. Essa estrutura permanece sob a forma de uma criança interna ferida.
No caso de Anita*, quando adulta, qualquer pessoa que tenha certa autoridade, representará as figuras de autoridade da sua infância, especialmente seu pai e sua mãe. Mesmo já sendo adulta, a sua criança interior ferida estará tentando mostrar para os pais que é capaz e, por associação, a todas as outras pessoas. Por isso, quem vive assim, torna-se uma pessoa muito infeliz. Tudo representa uma ameaça. Está sempre tentando provar aos outros que é capaz e, ao mesmo tempo, as suas crenças boicotam a sua capacidade.
A criança interior é, portanto, a estrutura psíquica subconsciente que trazemos, fruto das experiências que tivemos na infância, que pode ter sido mais, ou menos feliz, ou pode ter sido mais, ou menos maltratada. Quando a pessoa foi maltratada na infância, a criança interna que esse adulto traz em si, está ferida, necessitando ser curada.
No próximo artigo continuaremos a refletir sobre como podemos curar a criança interior.
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